terça-feira, 19 de dezembro de 2017

Encontro de Coros da UFCG

O canto coral na cidade de Campina Grande sempre esteve muito ligado ao contexto universitário. Nos anos setenta e oitenta, a Fundação Universidade Regional do Nordeste (FURNE) e a Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Campus II, ganharam projeção nacional por conta dos seus corais. Durante muito tempo, grupos de diferentes partes do Brasil participaram do Festival de Inverno de Campina Grande e dos encontros promovidos pela Fundação Artístico-Cultural Manuel Bandeira, iniciativas que foram interrompidas por conta de vários fatores mas que serão retomadas amanhã, dia 20 de dezembro, com a realização do I Encontro de Coros da Universidade Federal de Campina Grande.

O evento tem como objetivo apresentar à comunidade o trabalho que tem sido desenvolvido na UFCG. Além do Coro em Canto, o mais antigo da instituição, atualmente estão em atividade o Coral Assum Preto, sediado no Campus VI, na cidade de Sousa, o Coro Infanto-Juvenil, o Coro Feminino, o Coro Masculino, o Coro Intergeracional, o CorUNAMUS e o Coro de Câmara de Campina Grande, estes últimos ligados à graduação em Música, no Campus I.

Este encontro marca o nascimento do CanteMUS - Laboratório Coral da UFCG, criado com o propósito de congregar cantores e regentes, oferecendo-lhes subsídios técnicos e artísticos que possam contribuir para a consolidação desta prática sócio-cultural-educativa. Os coros ligados ao CanteMUS são regidos por alunos da Licenciatura e do Bacharelado, que têm a oportunidade de associar teoria e prática, aplicando os conteúdos estudados em sala de aula, bem como os resultados das pesquisas desenvolvidas pelo Grupo de Pesquisa Unificadas em Artes e Música (GRUNAMUS - UFCG/CNPq), conectando assim, ensino, pesquisa e extensão.

A proposta de cada coral tem como base a faixa etária e a experiência musical dos seus integrantes. De modo geral, cada um trabalha entre duas e quatro horas semanais. Nesses encontros, além de aulas de técnica vocal e teoria musical, ensaiam o repertório, que inclui tanto música sacra quanto secular, brasileira e internacional, de diferentes períodos, épocas e autores, a cappella e com acompanhamento. A pretensão é realizar o encontro duas vezes por ano, sempre ao final de cada semestre. A meta é também promover o intercâmbio com outros grupos, maestros e instituições. Ano que vem, por exemplo, durante a nona edição do Festival Internacional de Música de Campina Grande, os integrantes do Laboratório Coral da UFCG terão a oportunidade de interagir com maestros convidados, brasileiros e do exterior. Indiscutivelmente, essa expansão quantitativa e qualitativa influenciará, a curto, médio e longo prazo, o movimento coral na cidade, no estado e na região, estimulando a formação de novos grupos, criando mais oportunidades no mercado de trabalho para compositores, arranjadores, cantores, regentes e preparadores vocais, que poderão atuar em diferentes segmentos, com coros amadores e profissionais.

Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com)

domingo, 26 de novembro de 2017

Canção de esperança

A semana foi dinâmica na Universidade Federal de Campina Grande, porque, à semelhança de outras instituições, também celebramos o Dia do Músico, 22 de novembro, com uma vasta programação, organizada por um grupo de alunos e que contou com a supervisão de alguns professores. A meta é realizar o evento anualmente, tornando-o cada vez mais amplo e promovendo o diálogo entre ensino, pesquisa e extensão, expandindo a relação entre a UFCG e a sociedade.

Ao longo da SEMUS, discutimos temas atuais. Marisa Nóbrega falou sobre o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID), que poderá ser interrompido por conta dos cortes nas verbas do Ministério da Educação. Cleisson Melo e Jorge Ribbas abordaram a produção musical na contemporaneidade, focando nas questões mercadológicas, tema que também serviu de mote para a rodada sobre marketing na música, coordenada por Fábio Cavalcanti. João Valter Ferreira Filho tratou das perspectivas para a pós-graduação para licenciados em música e Alda Leaby nos fez pensar sobre inclusão, dialogando e cantando em LIBRAS — indiscutivelmente, um dos pontos altos desta sessão ocorreu quando os participantes interpretaram Carinhoso, de Braguinha e Pixinguinha, usando a Língua Brasileira de Sinais.

No que diz respeito à programação artística, realizamos várias apresentações. Ocupamos a praça do Centro de Humanidades, que serviu de palco para o Coro em Canto, a Orquestra e o Coro de Câmara, bem como para os alunos que prepararam um show dedicado à MPB, enquanto na Primeira Igreja Batista e na sala BW4 apresentaram-se a Big Band, a Orquestra de Violões, o Coro Feminino, o Consort Vivace, dentre outros grupos. Foi no nosso auditório que vimos a estreia de mais uma promessa, um quinteto de choro, formado por dois violões, cavaquinho, percussão e trombone.

A iniciativa dos alunos do curso de Música nos ensina que é preciso agir. Eles saíram da zona de conforto, provocaram colegas, professores, administradores, a comunidade, demonstrando que não se contaminaram com aqueles que arrotam insolências travestidas de discursos politizados, que criticam sem ter trajetória, que tentam justificar a inércia acadêmica e profissional na qual se encontram com argumentos questionáveis, alegando a escassez de recursos, os tempos temerosos que vivemos, as inadequadas condições de trabalho, como se a conquista do paraíso fosse pura mágica. Todos os que participaram deste empreendimento estão de parabéns, sobretudo a comissão organizadora. A Semana de Música da UFCG serviu para que pudéssemos reafirmar nosso compromisso, a força do engajamento e o sentido de pertencimento, que, não obstante os limites impostos pela macroestrutura econômica, política e social, nos faz resistir e valorizar as possibilidades, inspirados pela Canção de Esperança que o advento traz e que, nos versos de Flávia Wenceslau, tece a linha do horizonte e nos ensina que o amor jamais nos deixará.

Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com)

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

Um som inconfundível

O maestro Nelson Mathias regeu o Coral da UFPB, Campus II, Campina Grande, entre 1978 e 1982. Formado por cerca de sessenta cantores, o coro ensaiava nas dependências do Núcleo de Extensão Cultural, no Teatro Municipal Severino Cabral, duas horas por dia, de segunda a sexta-feira. A preparação vocal do conjunto estava a cargo da professora Célia Bretanha Junker, cuja ação didático-pedagógica tinha como base os princípios propostos por Madeleine Mansion. A sonoridade era leve e ágil, razão pela qual o grupo dedicou-se à interpretação de várias obras da renascença francesa.

As gravações das apresentações do Coral da UFPB, arquivadas em fitas k-7, em diferentes eventos entre 1978 e 1979, reiteram o que estamos falando. Muito embora parcialmente comprometidos pela ação do tempo, nestes áudios é possível identificar vários elementos. A técnica vocal está em processo de consolidação e há equilíbrio e controle da dinâmica e da articulação. Percebe-se o fraseado musical, bem como o diálogo entre os diferentes naipes. Também é notória a precisão rítmica, que ressalta os aspectos percussivos da nossa música popular, assim como as sutilezas e as entrelinhas dos excelentes arranjos assinados por Arlindo Teixeira, Clóvis Pereira, Damiano Cozzella e o próprio Nelson Mathias.


Célia Bretanha e Nelson Mathias concebiam a música para além dos aspectos técnicos. Para eles, era necessário que os cantores compreendessem poética, filosófica e espiritualmente o que era cantado, a polissemia músico-textual, motivo pelo qual o Coral da UFPB normalmente não se apresentava com partituras, pois, na concepção do seu regente, os cantores deveriam estar livres para ver o maestro e para transmitir com mais liberdade o sentido musical daquilo que se cantava.


O Coral da UFPB, sob a direção desses profissionais, foi premiado em festivais, recebeu o reconhecimento do público e da crítica. A proposta, além de artística e educativa, foi também política. Como atestado em alguns dos relatos coletados na pesquisa que realizamos, repetidas vezes o público surpreendeu-se com a atuação do coro. Mesmo sabendo que o grupo era coordenado por dois expoentes nacionais, frequentemente esperava-se do “Coral da Paraíba” um direcionamento técnico e artístico inconsistente, um repertório predominantemente regional e adornado com o placebo cênico, recurso em voga àquela época e que até hoje continua sendo usado, na maioria das vezes, para mascarar incompetências.
A admiração era proporcional ao preconceito. Por isso, quando o coral interpretava com maestria a literatura de diferentes países, autores e períodos, o silêncio, o encantamento, a curiosidade e o respeito também preenchiam todos os espaços. Os Cantores da Rainha contrariaram expectativas, desconstruíram estereótipos, romperam barreiras. Para conhecer mais sobre essa página da nossa história, ouça o inconfundível som do Coral da UFPB e leia a nossa comunicação no XXII Congresso Nacional da ABEM, realizado em Natal-RN, em 2015.
Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com

sábado, 18 de novembro de 2017

Música na UFPB

A criação do Núcleo de Extensão Cultural (NEC), no Campus II da Universidade Federal da Paraíba, iniciativa do Reitor Lynaldo Cavalcanti de Albuquerque, contribuiu para dinamizar a vida artística do município de Campina Grande. Há alguns anos, realizei pesquisa com Jeter Maurício da Silva Nascimento com o objetivo de analisar as práticas musicais na referida instituição, entre 1978 e 1982, época na qual o NEC teve importantes conjuntos, dentre os quais o Coral da UFPB, o Quinteto Armorial e o grupo Cordas e Sopros. Nossa meta foi contribuir para a preservação e o resgate da memória e história da cidade, região e do país, oferecendo subsídios para a compreensão da prática coral na época em questão e no momento atual.

O trabalho foi dividido em três partes. Na primeira seção, discutimos os princípios da Nova História Cultural, bem como o papel da Memória e da História Oral. Na segunda, tratamos da criação do Núcleo de Extensão Cultural da UFPB, tendo como base estudos variados, os depoimentos dos professores fundadores e dos sujeitos que viveram naquele contexto. Na terceira, e última etapa, descrevemos a estrutura e o funcionamento do Coral da UFPB, sob a direção dos professores Nelson Mathias e Célia Bretanha. A ênfase, nesta parte, recaiu sobre o processo de seleção dos cantores, o repertório, a metodologia do ensaio, os concertos e as viagens realizadas, bem como outros aspectos sociais, educativos e culturais.


As atividades desenvolvidas no Núcleo de Extensão Cultural abrangiam cursos nas áreas de teatro, fotografia, cinema, artes plásticas e música, incluindo o ensino de diversos instrumentos e matérias teóricas. Estes cursos foram responsáveis pela formação de um grande número de profissionais - eu, por exemplo, iniciei minha vida musical por lá. As contribuições de Nelson Mathias e Célia Bretanha foram determinantes para o surgimento de outros grupos corais na UFPB e na cidade, depois de 1982, dentre os quais o De Repente Canto (UFPB), coordenado por Fernando Rangel, e o Coro em Canto (UFPB-UFCG), que teve como regentes Marisa Nóbrega, Luciênio Teixeira e atualmente é conduzido por Lemuel Guerra.


Hoje, além do Coro em Canto, estão em pleno funcionamento seis outros coros, que integram o Laboratório Coral da Universidade Federal de Campina Grande e também estão vinculados ao Grupo de Pesquisas Unificadas em Artes e Música (GRUNAMUS-CNPq), a saber: Coro Infanto-Juvenil, Coro Feminino, Coro Masculino, Coro Intergeracional do PIATI, CorUNAMUS e Coro de Câmara de Campina Grande. Esses grupos funcionam como coro-escola, auxiliando os estudantes da Licenciatura e do Bacharelado em Música no desenvolvimento das suas habilidades, ratificando a conexão entre ensino, pesquisa e extensão. Para saber mais sobre esse capítulo da nossa história, leia o relato que apresentamos no XIII Encontro Regional da ABEM, na cidade de Teresina-PI, em 2015.


Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com)

domingo, 24 de setembro de 2017

Mão e contramão

Quando iniciei o doutorado em Regência Coral, na Louisiana State University, em Baton Rouge, Estados Unidos da América, tive a oportunidade de experimentar um momento único em minha caminhada pessoal e profissional. Aqueles anos provocariam revoluções, seriam responsáveis por mudanças radicais, verdadeiros divisores de águas, que afetariam o meu fazer/saber musical profundamente. Entre o encanto e o espanto, vivi um enorme choque cultural já nos primeiros meses por conta do clima, da comida, das relações interpessoais. A adaptação foi complexa e gerou desconforto emocional, razão pela qual tive problemas psicossomáticos. Nessa mesma fase, muitos questionamentos vieram à tona, especialmente no que diz respeito a minha práxis pedagógica.

Nos ensaios com o LSU A Cappella Choir, por exemplo, fiquei impressionado com o repertório interpretado, a metodologia de trabalho, a sonoridade do conjunto, que, muito embora formado majoritariamente por alunos da graduação e da pós em canto, soava como um coro e não um grupo de solistas. O emprego do solfejo móvel, as partituras editadas e comercializadas por empresas especializadas, a relação entre os músicos, bem como a atitude colaborativa e proativa de todos os envolvidos naquele processo me faziam pensar no Brasil, na nossa realidade, no meu dia-a-dia e de tantos outros conjuntos e colegas.

Para extravasar, resolvi, então, escrever e refletir sobre o que me incomodava, sobre a minha responsabilidade ao voltar para o Brasil, ponto que já havia sido tratado com o CNPq durante o trâmite para a concessão da bolsa de estudos. Assim, o texto foi nascendo, na velocidade da minha ansiedade, resultando num artigo que foi publicado no site Piano Class, no Rio Grande do Sul. No texto, falo sobre a expansão do canto coral brasileiro, ressaltando os aspectos positivos e negativos dessa ampliação. Discuto, entre outros pontos, a relação entre música popular e erudita no repertório coral, a criação de arranjos e o mercado editorial nacional. Trato também do imediatismo que orienta as ações de muitos maestros, que priorizam o produto e não o processo, isto é, as apresentações públicas em detrimento dos ensaios, e do comportamento eminentemente bancário e passivo, usando a máxima Freiriana, que predomina neste cenário.

Como já mencionado, o texto foi escrito há dezesseis anos e reflete parte das minhas inquietações naquele período. Foi a partir daí que comecei a repensar o meu cotidiano e a reconsiderar verdades arraigadas. Há poucos dias alguém reencontrou esse material e me pediu permissão para publicá-lo novamente, alegando que a temática continuava atual. Fiquei em dúvida, mas prossegui. Longe de querer encerrar as discussões, espero que Mão e contramão: os (des) caminhos do canto coral brasileiro suscite o debate entre os colegas e nos faça rever valores, os paradigmas da nossa filosofia coral.

Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com)

domingo, 3 de setembro de 2017

Here I Am, Lord.

Here I Am, Lord é o título de um hino muito popular nos Estados Unidos da América. A obra, composta em 1981 por Dan Schuttle e baseada nos livros de Isaías (Capítulo 6) e Samuel (Capítulo 3), é frequentemente cantada na liturgia católica em diversas ocasiões ao longo do ano. Logo após a minha chegada em Baton Rouge, ouvi pela primeira vez esta canção numa missa na capela Christ The King, no campus da Lousiana State University. Naquela manhã acinzentada e fria de domingo, fui aquecido por tais versos, que me fizeram pensar sobre os meus dias naquele tempo-lugar.

Alguns meses depois, quando entrei para o coro da First United Methodist Church, sob a direção de Lammar Drummonds, encontrei-me novamente com a obra, desta feita com o arranjo para coro misto a quatro vozes e piano escrito por Ovid Young. No ano seguinte, já regendo o coro da Zachary United Methodist Church, não tive dúvida sobre com qual música começar a minha temporada naquela comunidade. Assim que cheguei, pedi para que os cantores abrissem o hinário na página 593 para ensaiarmos o referido cântico. No meu último culto na ZUMC, na Páscoa, tive a oportunidade de interpretá-la mais uma vez, razão pela qual adquiriu um valor simbólico muito importante, marcando momentos de transição em minha trajetória pessoal e profissional.

De volta ao Brasil, agora com o Madrigal da UFPI, inseri o mesmo arranjo no repertório do grupo. A peça passou a fazer parte dos nossos ensaios e foi estreada no I Festival Internacional de Música da UFPI, sob a direção do maestro norte-americano Gary Packwood com Bruna Vieira ao piano. Muito embora inexperiente, porque tinha apenas seis meses de fundação, o Madrigal trabalhou com afinco, identificando-se plenamente com a mesma. Ano passado, trabalhei a obra com o Coro de Câmara de Campina Grande, mas não cheguei a apresentá-la. Há poucos dias, não sei por qual razão, resolvi resgatá-la, tendo em vista a preparação do nosso Concerto para o Advento.

Os fatos e as reflexões da última semana me fizeram conectar pontos e perceber a sintonia das coincidências. Ainda há muito para construir, compartilhar, aprender, dizer, cantar, sentir, ouvir, tocar, transformar. E como meu trabalho está inacabado, é preciso, portanto, prosseguir com o ofício. Foi por isso que ontem, ao ouvir Here I Am, Lord (veja vídeo), renovei propósitos e recobrei forças no intuito de superar limites, vencer adversidades, sobrepujar medos. As provações só nos fortificam e tanto a música quanto a mística têm papel fundamental nesse processo de restauração emocional e espiritual. Assim, tal como o profeta ao ouvir a voz do Senhor perguntando quem Ele deveria enviar, quem iria em nosso nome, eu respondi: Eis-me aqui. Envia-me!

Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com)

quarta-feira, 16 de agosto de 2017

Por isso, minha gratidão, Teresina.

A primeira vez que estive em Teresina foi em outubro de mil novecentos e noventa e dois. Fui para a capital piauiense por conta do concurso público para professor da Universidade Federal do Piauí. Passei uma semana por lá, fazendo provas, semeando novas amizades. Voltei para casa feliz, aprovado, com a imagem dos fins de tarde alaranjados e o aroma dos cajueiros. Aqueles dias foram suficientes para compreender o sentido da expressão bê-erre-o bró, usada em referência ao quadrimestre final do ano e baseada nas últimas sílabas dos meses que o compõem, e que sintetiza as altas temperaturas da estação.

No ano seguinte, no dia do meu aniversário, fui contratado. Migrei para lá com o pouco que tinha, algumas roupas e livros, bem como todos os sonhos que poderia carregar comigo. Ao chegar, fui recepcionado pelo maestro Emmanuel Coelho Maciel, que me acolheu com carinho paternal. A professora Lúcia de Fátima também me recebeu como uma mãe, sempre muita atenciosa. Depois, quando Jane chegou, a caminhada ficou ainda melhor.

Gradualmente, conheci a cidade, incluindo sua história, seus lugares, suas gentes e seus sabores. Cruzei com o Cabeça-de-Cuia, o Troca-Troca, a Frei Serafim, a igreja de São Benedito, o Encontro dos Rios, o doce de buriti, a cajuína com Maria-Isabel. Interagi com vários alunos, profissionais e grupos, dentro e fora da universidade. Convivi com colegas como Reginaldo Carvalho, regi o Madrigal Vox Populi, conheci o Projeto Música Para Todos e também vi nascer, tocando flauta ao lado de Zé Rodrigues, a Orquestra Sinfônica de Teresina. Fiquei impressionado com o trabalho do professor Marcílio Flávio Rangel. Radicado na Chapada do Corisco há muitos anos, esse paraibano entrou para a história daquele lugar por conta das suas ações no campo humanitário e educacional. Seu legado está presente na Casa Dom Barreto, na Escola Popular Madre Maria Vilac, no Instituto Dom Barreto, onde Vinicius e Sofia estudaram. Foi para meus filhos e seus colegas que compus várias canções, muitas das quais ainda estão presentes no cancioneiro daquele educandário.

A Universidade Federal do Piauí foi também minha escola. Lá aprendi a lecionar, a ampliar meu espírito empreendedor e a participar ativamente da administração universitária, percebendo os limites e possibilidades da gestão pública. Naquela instituição, atuei de forma intensa e vivi uma das maiores histórias de amor da minha vida ao lado dos integrantes do Madrigal da UFPI (veja vídeo), grupo que regi por quatro anos e no qual tive grandes cantores, muitos dos quais hoje são meus amigos e frequentam a minha casa, o meu coração. Como o tempo decanta tudo, encontrei hoje essas memórias guardadas bem no fundo do peito. Por isso, minha gratidão, Teresina.

Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com)

*Para Teresina, no dia da celebração dos 165 anos.

domingo, 13 de agosto de 2017

Se não se amarrar, não vende!

Tocar ou cantar em grupo é uma tarefa desafiadora, pois, além de interpretar o repertório, executando-o no tempo, afinado e com técnica, é preciso observar o outro, interagindo, ao mesmo tempo, de forma autônoma e interdependente. Para ler o que há por trás de cada olhar e movimento, um grupo necessita ensaiar de forma consistente por um período considerável de tempo. Muitas vezes, as informações são sutis e passadas discretamente, suprimindo toda e qualquer necessidade de verbalização. Mas esse conhecimento só brota com a intimidade, que, por sua vez, é fruto de uma convivência saudável e pautada no respeito e na confiança.

Como regentes, desenvolvemos um cabedal de gestos com o qual nossos coros, bandas e orquestras se familiarizam. Muito embora pretensamente universais, eles carregam elementos idiossincráticos, com os quais chamamos a atenção para pontos específicos, dentre os quais a sonoridade, o fraseado, a precisão rítmica, os formatos das vogais, as passagens mais complexas. O olhar fixo nas mãos, o vai-e-vem do tronco e a forma como nos dirigimos para um determinado naipe falam sobre as verdades construídas ao longo de várias horas de ensaio. Quanto mais conseguimos ler as entrelinhas, captando, assim, o não-dito, mais diligente e carregada de sentido será a nossa performance. Quando há correspondência mútua, aí, então, a fruição estética se torna mais intensa, atingindo também o público, que reage proporcionalmente ao grau de envolvimento e cumplicidade que demonstramos no palco.

No documentário Sob o Céu de Zabé (veja o vídeo), produzido por Márcia Paraíso, em 2014, e que trata da vida e obra de Isabel Marques da Silva (1924-2017), mais conhecida como Zabé da Loca, uma passagem chama a atenção. Pitó, que integrava o terno-de-zabumba dessa famosa agricultora-musicista que viveu no Cariri Oriental paraibano, dá um depoimento singular, no qual descreve suas experiências e diz que “a música é uma entremelagem de juntamento.” Analisando a sua fala, nota-se que ao usar o vocábulo entremelagem, provavelmente uma corruptela do verbo francês entrêmeler, ele reitera o sentido de entrelaçamento que as práticas de conjunto, tanto instrumentais quanto vocais, evocam, convidando-nos também a refletir sobre a complexa relação que se estabelece entre o indivíduo e o grupo nestas e em outras instâncias do saber/fazer musical.

O emblemático discurso do percussionista revela a força da construção coletiva e reforça a crença de que para tocar e cantar com outras pessoas é preciso observar muito mais que as frequências, as durações e suas respectivas articulações e variações de intensidade. Sem diálogo e interação não há conjunto. Por isso, Pitó, de forma sábia e graciosa, é enfático ao comparar um grupo musical a um leirão de coentro dentro de um balaio num dia de feira. Nos dois contextos, “se não se amarrar, não vende!”

Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com)

domingo, 30 de julho de 2017

Utopia e ousadia

O 11th World Symposium on Choral Music (WSCM), promovido pela International Federation for Choral Music (IFCM), aconteceu em Barcelona. Nesta edição, participaram grupos convidados e selecionados dos cinco continentes, que interpretaram repertórios variados, incluindo obras de referência da literatura, assim como novas composições encomendadas especialmente para o evento.

Muito embora todos os coros participantes tenham apresentado elevado grau técnico e artístico, alguns se destacaram. O Ansan City Choir, da Coreia, regido pelo Dr. Shin-Shwa Park, por exemplo, além do domínio músico-vocal, ensinou-nos sobre a conexão entre corpo-movimento-som. O concerto na Sagrada Família, e do qual participaram mais de duzentos cantores da Catalunha, foi todo dedicado à música sacra da região, incluindo obras da Idade Média aos dias atuais. A culminância foi ouvir Nigra Sum, de Pablo Casals, que acompanhou parte da construção daquele templo e escreveu este moteto em homenagem à Virgem Negra de Montserrat. Foi uma experiência única, mística e musical, que nos enlevou, um verdadeiro bálsamo para os ouvidos e o coração.

O WSCM também ofereceu uma programação acadêmica. A conferência da professora Sharon Paul, intitulada Regendo com o cérebro: técnicas para aumentar a capacidade de engajamento dos cantores, foi uma das mais concorridas, reiterando a correlação entre autonomia e interdependência na prática coral. A música brasileira também esteve nas discussões. Enquanto Isak Lucena, da Universidade Potiguar, fez uma retrospectiva da nossa tradição coral do período colonial até os dias atuais, destacando autores e obras, eu me detive no século XX, mais particularmente no trabalho do compositor Reginaldo Carvalho. Em minha comunicação, destaquei os momentos mais importantes da trajetória deste paraibano, falando do seu estilo composicional, analisando pequenos trechos de suas obras, usando como exemplo as interpretações do Coro de Câmara de Campina Grande, gravadas recentemente em Nova Iorque. Houve, ainda, uma palestra dedicada às composições para vozes femininas, de Heitor Villa-Lobos, fruto das pesquisas de Elian Hingrid Kujawinski.

A décima primeira edição do WSCM nos fez refletir sobre muitos aspectos da nossa práxis. Precisamos intensificar as ações formativas, tanto sob a perspectiva do regente quanto dos coralistas. Ao mesmo tempo, temos que organizar o movimento no âmbito nacional, agregando o maior número de coros possível, a exemplo do que já fazem tantas associações e federações, dentre as quais a ACDA e a ADICORA. Sem tal organismo, nossa inserção no panorama internacional e em eventos deste porte será limitada, fruto de iniciativas pessoais e não de um todo organizado e legitimado por seus pares e a sociedade. A estrada é longa e repleta de curvas. Continuemos a caminhada, alimentando as utopias, sem esquecer, é claro, da ousadia.

Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com)

segunda-feira, 3 de julho de 2017

VIII FIMUS e I FIMUS Jazz

Iniciamos a contagem regressiva para a oitava edição do Festival Internacional de Música de Campina Grande e a primeira versão do FIMUS Jazz. Com o coração a mil, estamos finalizando os detalhes. É sempre bom lembrar que a realização de um evento deste porte, em nosso país e no atual contexto, é uma missão difícil. Sem o comprometimento daqueles que gerenciam as instituições promotoras do Festival, mais notadamente a Fundação Parque Tecnológico da Paraíba, a Universidade Estadual da Paraíba e a Universidade Federal de Campina Grande, nada disso seria possível.

Este ano, nossos convidados vêm de diferentes estados brasileiros, dos Estados Unidos, da Inglaterra e da Alemanha. A flautista Dagmar Wilgo e a cravista Luciana Câmara apresentarão o programa Duo Tweets, com obras de diferentes períodos e que têm como base o canto dos pássaros. O norte-americano Michael Pendowski vem da Auburn University para lecionar saxofone e também reger a nossa Big Band. Mais de cem pessoas integram as equipes de produção do Festival, que este ano recebe cerca de trezentos alunos.

Oito grupos da Paraíba, Rio Grande do Norte e Bahia participam dos concertos que acontecem à tarde, no Teatro Municipal e também nas cidades circunvizinhas. Em todos os conjuntos, notamos um forte diálogo entre tradição e vanguarda, a combinação do regional e do universal, elementos que demonstram o processo de reinvenção da nossa música. Ao longo da semana estão previstos lançamentos de CDs, incluindo Tempo Oportuno, de Paulo César Vitor. Outros grupos, como, por exemplo, o Trio Paraibô e o Tryá também farão o mesmo. No que diz respeito ao aspecto didático-pedagógico, oferecemos, pela primeira vez, oficinas de guitarra, baixo elétrico, bateria e piano com ênfase na música popular e no jazz. Hércules Gomes, uma das revelações da nova safra de pianistas brasileiros, além de tocar, também ministrará aula ao lado de Jow Ferreira, Cléber Campos e Júnior Primata. A inclusão da Missa de Alcaçus, de Danilo Guanais, cuja estreia ocorreu recentemente no Carnegie Hall, sob minha direção, também promete ser um grande momento da próxima semana. A obra será interpretada pelo Coro de Câmara de Campina Grande, Licio Bruno, Fellipe Oliveira, Alzeny Nelo e Regiane Yamaguchi.

O Festival Internacional de Música de Campina Grande já está no calendário de festivais do Brasil, sendo, portanto, uma excelente oportunidade para estudantes e profissionais renovarem seus horizontes. Para a população da Serra, trata-se de mais uma opção de entretenimento neste mês de férias. É muito bom ver que a Rainha da Borborema, ainda no clima junino, já se prepara para uma semana de grandes emoções com a chegada do VIII FIMUS e do I FIMUS Jazz.

Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com) 

segunda-feira, 12 de junho de 2017

O canto coral na Paraíba: Tom K

Antônio Carlos Batista Pinto Coelho, mais conhecido como Tom K, nasceu em Recife, Pernambuco, mas há muitos anos adotou a capital paraibana como sua terra natal. Graduado em Violão pela Universidade Federal da Paraíba, tornou-se uma referência no mundo musical por sua atuação como compositor e regente. Foi no final dos anos oitenta que tive o prazer de conhecê-lo, quando ingressei no curso de Licenciatura em Educação Artística, com habilitação em Música, no Campus I da UFPB. Tom K lecionava na graduação e foi um dos meus primeiros professores de Regência. Naqueles anos em João Pessoa, tive a oportunidade de acompanhar o trabalho que desenvolvera com o Madrigal Pedro Santos, indiscutivelmente um dos melhores coros que o estado já teve. Depois, por curto período, fui seu assistente no coral da Fundação Musical Isabel Burity.

Por conta da minha mudança para Teresina, passamos algum tempo afastados. Esse fato foi revertido quando nos reencontramos em Salvador. Na capital baiana, entre 1996 e 1999, fomos colegas no Mestrado em Música, na classe do professor Erick Vasconcelos. Vivemos intensamente aqueles três anos. Convivíamos diariamente na Escola de Música, no Vale do Canela. Caminhamos juntos, subindo e descendo ladeiras, pesquisando e conversando, às vezes em diferentes bibliotecas e salas, quase sempre no nosso apartamento, nos finais de semana. A avenida Princesa Isabel era reduto paraibano, o refúgio no qual eu, Jane, Tom K, Maurílio Rafael e Romério Zeferino, entre garfadas e goles, compartilhávamos nossas experiências, nos sentíamos em família. Há tanto o que contar sobre Tom K em terras soteropolitanas que certamente seria possível escrever um romance.

De modo geral, sua música é alegre, leve, reflete o seu espírito sagaz. O arranjo do Xote das Meninas, por exemplo, cantado mundo afora, eu considero um clássico. Ao longo de todos esses anos, Tom K contribuiu decisivamente para o desenvolvimento da prática coral em vários campos. Foi ele o responsável pela criação de muitos grupos e também a iniciação e formação de um grande número de regentes na região. Eu, como já disse, orgulhosamente me incluo neste rol. Ele também compôs e arranjou inúmeras obras, propôs aquilo que denomino de repertórios possíveis, com graus de dificuldade variados e que atendem às necessidades de diferentes conjuntos. 

É por isso que, neste momento, todas as homenagens lhes são pertinentes e justas. Recebe, portanto, maestro-amigo, nosso abraço de gratidão, nosso respeito, nosso reconhecimento por tudo o que você fez, nossos votos de felicidades. Que a aposentadoria seja apenas o início de uma nova fase e que você continue embelezando o mundo com sua música-poética, e prossiga construindo esse legado que incontestavelmente já entrou para a história da música no estado da Paraíba.

Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com)

domingo, 5 de março de 2017

Academia de Música Santa Cecília

A Academia de Música Santa Cecília (AMSC) é um projeto da Diocese de Campina Grande, realizado em parceria com a Fundação Parque Tecnológico da Paraíba e a Universidade Federal de Campina Grande por meio de um acordo de cooperação técnica. A AMSC tem como objetivo atuar no campo educativo e artístico, atendendo, inicialmente, alunos entre 8 e 17 anos. A nossa ação tem caráter inclusivo e visa, além dos aspectos técnicos, a integração e a interação entre crianças e adolescentes oriundos de diferentes contextos econômicos, sociais e culturais.

As atividades da AMSC contemplam múltiplas dimensões, dentre as quais o canto coral, a teoria e a flauta doce. Além de estimular a formação profissional e o aprofundamento nestas áreas, pretendemos também sensibilizar e socializar os participantes usando a música como elemento fundamental. As turmas, organizadas por faixa etária, têm entre 10 e 20 alunos, e a carga horária semanal é de 3 horas-aula. Os professores-bolsistas, alunos da graduação em Música da UFCG, ministram aulas e elaboram material didático, tendo a oportunidade de avaliar na prática, e de modo orientado e supervisionado, os resultados das investigações do Grupo de Pesquisa em Regência, Canto e Educação Musical (GREC-CNPq). Em acréscimo aos conteúdos específicos, os alunos da AMSC têm aulas de técnica vocal e interpretam repertório variado, apresentando-se regularmente em distintas localidades. O repertório do Coral da AMSC, por exemplo, contempla tanto música sacra quanto secular, pois queremos que os alunos tenham um amplo leque de oportunidades, expandam seus horizontes perceptivos. Em dezembro do ano passado, o grupo estreou no Mosteiro Santa Clara, durante a realização do Concerto para o Advento, cantando canções originalmente escritas para vozes infanto-juvenis (veja o vídeo).

Para a viabilizar o projeto, várias fontes de financiamento estão sendo estudadas. Os gestores da AMSC têm buscado parceiros, pessoas físicas e jurídicas, que possam contribuir economicamente com a iniciativa, ajudando a manter todas as atividades propostas em andamento. Todo semestre, os alunos são convidados a contribuir com o pagamento da taxa de inscrição, cujo valor é simbólico, dispensando-se aqueles que não dispõem de recursos financeiros. O Parque Tecnológico é o órgão responsável pela captação e gerenciamento do empreendimento.

A AMSC tem coordenação geral do Padre Luciano Guedes; Arlindo Almeida responde pela parte administrativa; eu assino a direção pedagógica e artística. A parceria entre a Catedral Diocesana, o PaqTcPB e a Universidade Federal de Campina Grande alarga as possibilidades para as práticas musicais na Rainha da Borborema, evidencia a relevância desse tipo de ação colaborativa, ratifica a necessidade de expandirmos nossos campos de atuação para além dos muros e paredes institucionais, democratiza o acesso à arte, socializa o conhecimento e o patrimônio cultural de diferentes países e períodos históricos, contribui para a consolidação da cidadania.

Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com

domingo, 19 de fevereiro de 2017

Não sei, só sei que foi assim!

No próximo mês de maio, estarei em Nova Iorque, debutando no Carnegie Hall, uma das salas mais famosas dos Estados Unidos. Na ocasião, participarei como convidado da série Distinguished Concerts International New York. Nesta temporada, que inclui grandes nomes do cenário musical norte-americano, sou o único regente brasileiro, fato que muito me honra, uma enorme responsabilidade.

Durante o processo de produção deste concerto, discutimos o repertório, selecionamos os grupos participantes e também a logística do evento. Por conta da relevância da proposta, decidi inserir no programa uma obra brasileira. Foi aí que surgiu a ideia da Missa de Alcaçus, de Danilo Guanais, paulista radicado no Rio Grande do Norte há vários anos. Escrita originalmente em 1996 para celebrar os trinta anos do Madrigal da UFRN, desde a estreia na capital potiguar, sob o comando do maestro André Oliveira, a missa já foi interpretada em diferentes partes do Brasil e no exterior. Eu mesmo já tive a oportunidade de regê-la duas vezes.

Convidei Danilo Guanais para fazer parte do projeto, provocando-o a reescrever a referida composição. Sugeri que nessa nova versão, que celebra os vinte anos do seu lançamento, ele tornasse a obra ainda mais atrativa e acessível. E assim ele procedeu, preservando o texto em latim e os ritmos de dança do Nordeste do Brasil, substituindo a parte do violão e da orquestra de cordas por um piano. Na estreia, contaremos com a participação de quase setenta cantores oriundos do Brasil, da França e dos Estados Unidos. O Coro de Câmara de Campina Grande abraçou o projeto sem hesitação, assim como o Tutti Choir BSB, sob a direção de Daniel Moraes, e o Loiret’s Singers, da França, sob a liderança de Julie Cássia Cavalcante. Regiane Yamaguchi, que integra o quadro docente da Universidade Federal de Campina Grande, será a pianista. O compositor também estará conosco em Nova Iorque, proferindo palestra sobre a música brasileira, acompanhando os ensaios e a performance, testemunhando esse momento ímpar das nossas trajetórias.

Estrear a Missa de Alcaçus, no Carnegie Hall, é celebrar a arte armorial, da qual Danilo Guanais é um dos seus representantes na contemporaneidade. Certamente, o aroma do Nordeste invadirá as ruas de Manhattan e por entre seus arranha-céus ecoarão as vozes e os romances da região de Alcaçus, coletados por Deífilo Gurgel e ressignificados nesta peça, bem como os gestos políticos e poéticos de Ariano Suassuna, que, diga-se de passagem, nunca pediu a bênção ao Tio Sam. Nesta reta final, lembrei-me de Gilberto Gil falando sobre o cosmopolitismo de Campina Grande e Nova Iorque (veja o vídeo) e fiquei pensando que se, algum dia, me perguntarem como tudo isso aconteceu, talvez, tal qual Chicó no Auto da Compadecida, eu diga, entre o riso e o espanto, a fé e a descrença: “Não sei, só sei que foi assim!”

Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com)