Dirigir artisticamente um evento é uma
tarefa complexa. Por mais espetaculares que sejam as nossas ideias, elas sempre
esbarram numa questão fundamental: o limite orçamentário. Tal situação se
agrava em época de crise econômica, quando as restrições são mais evidentes,
definindo, assim, as fronteiras das nossas escolhas, a liberdade criativa. Quando idealizamos um Festival, além
do aspecto financeiro, nós também pensamos na sua dimensão
sócio-educativa-política, posto que a música é produto da cultura, de um
determinado povo-tempo-lugar, da sua historicidade. É por meio do repertório,
por exemplo, que expandimos a percepção do mundo e do outro, que compreendemos
generalidades e idiossincrasias, aquilo que nos aproxima e nos distancia.
Nesta edição do FIMUS, celebramos o centenário do violonista Dilermando Reis. Ouvimos o panelaço do oratório profano Stella Splendens, de Eli-Eri Moura, que incomodou
parte da plateia, que optou por sair do Teatro por considerar a obra “excessivamente
provocativa”. Cantamos a Misa Criolla,
de Ariel Ramirez, acompanhados por instrumentos típicos da região, numa
referência à resistência dos povos da América Latina na luta contra as
ditaduras. Homenageamos Antônio José Madureira, fundador do Quinteto Armorial e
pioneiro no ensino de música no âmbito da UFPB, Campus II, nos anos setenta. Optamos
por uma programação centrada majoritariamente em obras e compositores nacionais,
incluindo Osvaldo Lacerda, Camargo Guarnieri, Ernst Mahle, Paulo Rios Filho,
Liduino Pitombeira, Dimitri Cervo, Vilani-Côrtes, Guerra-Peixe, Villa-Lobos e o
jovem Rafael Meira.
Colocamos a par e passo o permanente e o transitório, o novo e
o velho, o tradicional e o moderno, a identidade e o pertencimento.
Evidenciamos, em outros termos e como diria Bakhtin, o problema da relação
recíproca entre a infraestrutura e as superestruturas, isto é, como a realidade
determina o signo e como o signo reflete e refrata a realidade em
transformação, sobretudo tendo em vista a ubiquidade social da palavra/música (grifo nosso).
O encontro entre o iniciante e o
experiente, o micro e o macro, o som e o ruído, nos fez superar limites, conectar
extremos: Júlia Abdalla e Fredi Gerling; o Municipal e a Capela de São
Bento, na zona rural de Remígio; o Concerto
para dois trompetes em Ré Maior,
de Manfredini, e Plangeon, para
flauta solo, de Januibe Tejera, magistralmente interpretada por Lucas Robatto. O
trabalho de Phillipe Xadai, que assinou o projeto gráfico deste ano, e a
animação de Kadu Camilo também estão vinculados. À rigidez das retas do
tetragrama contrapõe-se um pontilhismo liquefeito e indefinido, verde e
amarelo, misturado, ora em tons pasteis, por vezes em tons vibrantes, tal como
o som das marchinhas carnavalescas executadas pela orquestra, na noite do encerramento
do Festival, e que nos fizeram dançar de mãos dadas, ao redor do Teatro, enquanto
renovávamos as utopias individuais e coletivas.
Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com)
Um comentário:
Bravo, excelente trabalho! Eu de longe só admirando, curtindo e torcendo por vocês! Que belo exemplo! Que prestação de serviço impecável para a educação, para a música, para a humanidade!
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