quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Coro cênico

No Brasil, a moda agora é coro cênico. Estou apreensivo, porque o coro tradicional poderá, brevemente, ser peça de museu, coisa de regente conservador e ultrapassado. A definição deste quadro é consequência direta da falta de qualificação dos regentes made in China, que estão no mercado de trabalho atuando de forma inadequada. Comumente, estes profissionais têm recorrido ao placebo cênico como forma de mascarar as deficiências que eles e os seus coros apresentam, pois o aspecto visual transfere o foco de atenção do som para o gesto, para o adereço, para a trama coreográfica, fazendo com que a afinação, a qualidade vocal, o fraseado, as variações de timbre, dinâmica e articulação sejam relegadas ao segundo plano.

Em nosso país, o coro cênico ganhou espaço no auge dos experimentalismos e das transformações ocorridas no panorama musical da primeira metade do século XX. A mudança técnica e estética no canto coral se fez notar na relação entre regentes e cantores, no padrão vocal, na postura corporal, no repertório, na vestimenta e na atuação cênica e musical do grupo, fato que abriu espaço para a inclusão de arranjos de música folclórica e popular brasileira e, dentre outros fatores, permitiu um tratamento interpretativo mais adequado, sobretudo no que diz respeito aos aspectos sonoros e gestuais. E é na década de oitenta que se constata no trabalho de alguns coros brasileiros a presença de determinadas tendências, que incluem o uso de movimentos corporais e o emprego de exercícios de expressão corporal no preparo das obras de forma geral.

Nos Estados Unidos, esta prática é muito comum em coros escolares. Aqui, a proposta tem sido usada mais frequentemente por coros adultos e com diferentes objetivos, incluindo os fins terapêuticos. Entre os anos 80 e 90, apresentei com o Nós em Voz dois espetáculos que misturavam música, teatro, dança, humor e literatura. Foi uma experiência válida. No entanto, quando percebi que estava deixando a matéria sonora para trás, na segunda fila, refleti e decidi que era hora de voltar às origens e explorar a literatura originalmente escrita para coro e ainda muito pouco interpretada por nossos grupos. A experiência musical e vocal dos nossos cantores precisa ser ampla e abrangente.

Combato o excesso. Critico aqueles que defendem o coro mexitivo, como sabiamente definiu Reginaldo Carvalho, alegando que o repertório coral, seja ele europeu, americano ou brasileiro, é difícil, chato e cafona. Sou contra o frenesi que está em voga e que só serve para justificar a incompetência dos aproveitadores de plantão. Defendo a coexistência de múltiplas tendências, cada uma com o seu cada qual, desde que a excelência vocal, musical e artística seja a tônica, o centro, a razão de ser da prática coral.

Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com)

8 comentários:

Anônimo disse...

é professor as pessoas preferem o mais facil do que o mais correto e bonito
mas enfim cada um com seu cada qual, né verdade??
rudrygo

Ferrari Jr. disse...

Escreveu e disse!

Anônimo disse...

Sempre existirá a esperança de um despertar... enquanto isso, é melhor que deixemos "cada um com seu cada qual"!

Anônimo disse...

Parábens pelo texto e pelo bolg em geral! Você sempre com ótimas idéias e esse talento para escrever...
Sempre compartilhei dos seus ideias de mudança, progresso,colaboração e de excelência artística.
abração
Luana Torres

Anônimo disse...

Concordo em preservar a qualidade vocal, mas acredito que não podemos generalizar, existem côros cênicos no Brasil que conseguem ter movimentação corporal e manter a qualidade vocal sim!

Marcel Ramalho disse...

Também acho que não se pode generalizar. Existem coros cênicos bons, e não é preciso ir muito longe rpa encontrar. Mas, de qualquer forma, a situação descrita é verdadeira. Muitos deles se importam mais com o teatro e aí pronto, dá no que dá.

Bianca Almeida disse...

Concordo existirem varios regentes que aproveitam do cenico para esconder falhas na produção sonora,entretanto defendo um proposta onde o vocal está em primeiro plano. Mas compreendi seu pensamento...valeu mais uma vez!

Silmara Fernandes disse...

Que alívio! Eu achava que só eu tivesse tal opinião. Parabéns pela coragem de explanar idéias tão importantes e necessárias para a sobrevivencia de um trablaho de qualidade que, a meu ver, tem sido deixado de lado, infelizmente...
Pode ter certeza q suas palavras nos trazem encorajamento e incentivo. Obrigada por isso!

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