quinta-feira, 23 de abril de 2015

É clichê, eu sei, mas é verdade.

Depois de Olivet, o Coro de Câmara de Campina Grande seguiu para Gien, cidade com cerca de quinze mil habitantes. Ambas ficam na região do Vallée de la Loire, onde estão localizados suntuosos castelos. A estrada entre as duas comunidades é plana e colorida, especialmente nos dias em que a natureza mostra toda a sua exuberância. Apenas uma imponente usina nuclear, localizada nos arredores de Gien, faz contraponto com a paisagem campestre.

Quando chegamos na Église de Jeanne d’Arc, totalmente reconstruída após a Segunda Guerra Mundial, o sol começava a se por. A luz que passava por entre os vitrais refletia nas paredes, criando um ambiente avermelhado, acolhedor. Era domingo e o público não tardou a chegar, dando sinais de que a igreja ficaria lotada naquele anoitecer. Em pouco tempo, os mais de seiscentos programas que preparamos para a turnê haviam se esgotado. Toda a primeira parte do concerto foi dedicada à música sacra. Nosso programa realçou as conexões entre a França e o Brasil por meio das composições de Reginaldo Carvalho, Amaral Vieira e Maurice Duruflé. Finalizamos com uma sequência de spirituals e gospels, obras nas quais Paulo César Vitor mostrou toda a sua habilidade e competência. A atmosfera era contemplativa, mística. Pedro Furtado me disse que foi tomado pela emoção e não conseguiu cantar The Lord Is My Shepherd, de Allen Pote, porque lembrou-se de Carlos Lima, um amigo em comum que também era apaixonado por esta música.

As manifestações de apreço foram intensas ao longo do concerto. No intervalo, enquanto fazíamos a preparação para a interpretação da Messe en Sol, de Franz Schubert, o público fez pequenas ofertas em reconhecimento ao nosso trabalho. Ao término, fomos calorosamente aplaudidos por cerca de dez minutos. Repetimos o Gloria. A alegria novamente se fez presente e nos seguiu até o final da recepção, quando fomos saudados pelo prefeito de Gien e integrantes da administração local. Outra vez, ouvimos promessas de reencontro e continuidade do projeto.

Todos mereciam um prêmio pela brilhante atuação. Por isso, logo cedo, naquela fria segunda-feira, uma parte do grupo partiu para Paris. Os outros iriam no dia seguinte. Enquanto o trem desparecia lentamente na névoa rarefeita, embaçando temporariamente nossos gestos e olhares, corremos para visitar a Faïencerie de Gien, que produz utensílios e objetos em cerâmica de modo artesanal há mais de dois séculos. Depois, vimos castelos, pontes e ruas, tentando estabelecer relações entre passado e presente. À noite, eu, Paulo César Vitor e Julie Cássia Cavalcante apresentamos um recital-palestra sobre a canção de câmara brasileira. Finalmente, agradeci por tudo e, recorrendo ao Pequeno Príncipe, disse: “nós nos tornamos eternamente responsáveis por aquilo que cativamos.” É clichê, eu sei, mas é verdade.

Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com)

Nenhum comentário:

Postar um comentário