Em 1996, conheci Jasmin Martorell num curso de canto, em
Recife-Olinda. Ao longo de uma semana, entre vocalizes e ensaios, trabalhamos
intensivamente, nas aulas individuais e coletivas, preparando o repertório do
concerto de encerramento e no qual interpretei canções e árias, com
uma voz até então desconhecida por todos, inclusive por mim mesmo. Passei a
integrar os projetos da Sociedade de Canto Dionysio, com os docentes e discentes
do Conservatório Pernambucano de Música, sob a liderança de José Renato Accioly
e Julie Cássia Cavalcante (veja os programas).
Depois daquele encontro, agendamos mais duas temporadas com o professor franco-catalão. Nós nos reunimos, definimos as datas e rateamos o custo, assegurando, deste modo, a cobertura do investimento e a remuneração do nosso estimado convidado. Em geral, a cada temporada, passávamos cerca de quinze dias ensaiando, preparando solos, duos, trios e quartetos, bem como cenas de ópera. Jasmin não parava nem cansava. Ele trabalhava diuturnamente com o pragmatismo que lhe era bem singular: vocalizes, dicção, compreensão textual, interpretação, tudo isso acompanhado de muita repetição, cobrança e, como não poderia faltar, um pouco de estresse.
Essa rotina de trabalho repetiu-se ao longo de 1997. Numa dessas idas à capital pernambucana, fui convidado para passar seis meses em território francês, estudando por lá. Organizei a vida, fiz as contas, consegui autorização para seguir neste novo projeto, que também integraria as atividades do PPGMUS-UFBA, e parti rumo à Europa. Deixei o escaldante verão nordestino e enfrentei o frio congelante de Toulouse, essa linda cidade avermelhada, situada no coração do sul da França, entre o Mediterrâneo e o Atlântico. Morei na zona rural, na casa da família Martorell, que me recebeu como filho. Todos os dias, saía cedo em direção ao Conservatório Nacional a fim de estudar, ensaiar e visitar a biblioteca. À medida em que o tempo avançava, fui melhorando a comunicação, a fluência na língua francesa, a socialização com os novos amigos, oriundos de tantos países.
Aquele semestre mudou a minha vida, abriu horizontes e ratificou uma premissa básica: tudo o que nós necessitamos é ter uma oportunidade. E comigo não foi diferente. A chance veio, eu mergulhei, nadei e cheguei às margens de outros oceanos. Mexendo em meus arquivos, encontrei as fotos, o programa (feito à mão, ressalte-se) e uma fita K-7 com a gravação de um dos concertos que participei naquela temporada, cantando Villa-Lobos (veja o vídeo). A alegria foi indescritível. Lembrei-me do meu primeiro professor de canto, que, num passe de mágica, fez eclodir a voz que somente eu ouvia, latente e pulsante, no mais recôndito esconderijo da alma. Ainda sorrindo com o eco da tua fala me dizendo sí, eres tenor, hoje, Jasmin Martorell, são para ti todas as reverências, o mais profundo respeito, o meu sincero amor.
Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com)
Depois daquele encontro, agendamos mais duas temporadas com o professor franco-catalão. Nós nos reunimos, definimos as datas e rateamos o custo, assegurando, deste modo, a cobertura do investimento e a remuneração do nosso estimado convidado. Em geral, a cada temporada, passávamos cerca de quinze dias ensaiando, preparando solos, duos, trios e quartetos, bem como cenas de ópera. Jasmin não parava nem cansava. Ele trabalhava diuturnamente com o pragmatismo que lhe era bem singular: vocalizes, dicção, compreensão textual, interpretação, tudo isso acompanhado de muita repetição, cobrança e, como não poderia faltar, um pouco de estresse.
Essa rotina de trabalho repetiu-se ao longo de 1997. Numa dessas idas à capital pernambucana, fui convidado para passar seis meses em território francês, estudando por lá. Organizei a vida, fiz as contas, consegui autorização para seguir neste novo projeto, que também integraria as atividades do PPGMUS-UFBA, e parti rumo à Europa. Deixei o escaldante verão nordestino e enfrentei o frio congelante de Toulouse, essa linda cidade avermelhada, situada no coração do sul da França, entre o Mediterrâneo e o Atlântico. Morei na zona rural, na casa da família Martorell, que me recebeu como filho. Todos os dias, saía cedo em direção ao Conservatório Nacional a fim de estudar, ensaiar e visitar a biblioteca. À medida em que o tempo avançava, fui melhorando a comunicação, a fluência na língua francesa, a socialização com os novos amigos, oriundos de tantos países.
Aquele semestre mudou a minha vida, abriu horizontes e ratificou uma premissa básica: tudo o que nós necessitamos é ter uma oportunidade. E comigo não foi diferente. A chance veio, eu mergulhei, nadei e cheguei às margens de outros oceanos. Mexendo em meus arquivos, encontrei as fotos, o programa (feito à mão, ressalte-se) e uma fita K-7 com a gravação de um dos concertos que participei naquela temporada, cantando Villa-Lobos (veja o vídeo). A alegria foi indescritível. Lembrei-me do meu primeiro professor de canto, que, num passe de mágica, fez eclodir a voz que somente eu ouvia, latente e pulsante, no mais recôndito esconderijo da alma. Ainda sorrindo com o eco da tua fala me dizendo sí, eres tenor, hoje, Jasmin Martorell, são para ti todas as reverências, o mais profundo respeito, o meu sincero amor.
Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com)
6 comentários:
Que lindo, professor! Que emocionante relato e que maravilha ouvir o senhor cantando, a voz tão linda! Meus olhos ficaram marejados. ☺️
Belíssimo! Isso é um exemplo de empreendimento com frutos eternos.
Querida Sílvia, essa história foi super intensa e mudou a minha vida para sempre. Eu fiquei muito feliz quando encontrei esse material. Beijos.
Danilo Guanais, meu amigo, ainda hoje colhemos os frutos dessa temporada na França. E que bom que você está comigo, participando de tudo isso nos dias de hoje. Um grande abraço.
Nossa me emocionei!
Que história inspiradora, professor.
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