quarta-feira, 1 de abril de 2020

Trabalhando com coros de idosos

Quem trabalha com coros de idosos sabe que, além dos conhecimentos musicais e vocais, é preciso compreender as mudanças fisiológicas e psicológicas que ocorrem nesta fase da vida. Há um processo gradativo de ossificação das cartilagens e de atrofia da musculatura vocal que provoca tensão na região laríngea, dificultando a produção sonora. Mulheres e homens, indistintamente, sofrem com o desajuste hormonal por causa da menopausa e da andropausa. As alterações no timbre, a diminuição na agilidade e a perda no controle da intensidade nos extremos da tessitura e do vibrato evidenciam tais transformações temporais. É certo que tudo isso muda conforme o histórico individual e pode ser acentuado quando o corista é inexperiente ou lida com outras doenças crônicas. Logo, quanto mais variantes, mais ponderado deverá ser o trabalho do regente.

As atividades físicas, em qualquer época, são boas para manter o corpo e a voz saudáveis, exercitando os pulmões constantemente. Neste sentido, é bom observar o manejo respiratório, sobretudo se a força muscular do cantor estiver comprometida. Quanto aos vocalizes, cantá-los levemente, mantendo os ressonadores ativos, acionando os músculos intrínsecos da laringe, buscando uma sonoridade misturada, que amenize o uso excessivo da voz de peito, favorecendo a construção do som almejado pelo maestro. Para expandir a extensão, sequências descendentes por graus conjuntos, conectando todos os registros, sempre legato e expressivo. O uso de um instrumento harmônico ajuda a manter a afinação, seja durante o aquecimento ou na realização do repertório. Aliás, a escolha do que cantar é algo a ser pensado criteriosamente, pois propostas inapropriadas comprometerão a atuação do grupo. Depois de selecionar as peças, definir os tons e elaborar os arranjos, é importante preparar uma edição legível, em tamanho adequado, tendo em vista as possíveis contingências visuais de alguns integrantes.

A sala de ensaios deve ser em local acessível para todos, incluindo aqueles com mobilidade limitada. A distribuição das cadeiras, a luminosidade e a ventilação do espaço, tudo, enfim, tem que ser estudado, e o planejamento dos encontros necessariamente levará em conta horário e duração dos mesmos, a sequência das tarefas, o intervalo e o momento dedicado aos assuntos administrativos. Um espaço para a partilha das experiências cotidianas e extramusicais promoverá a socialização e a integração do conjunto. A organização do cronograma pode ser anual ou semestral, abrangendo ensaios, concertos e a participação em festivais. Viagens com esse tipo de grupo exigem atenção redobrada, porque as demandas são mais complexas.

A prática coral com a terceira idade é legítima e precisa ser encarada responsavelmente. Apesar das iniciativas, há ainda um longo caminho a ser percorrido, que inclui a proposição de metodologias, o desenvolvimento de estratégias, a criação de uma literatura coral, bem como a elaboração de materiais auxiliares à atuação dos profissionais.

Vladimir Silva (silvladimir@gmail.com

2 comentários:

Marineide Maciel Costa disse...

Muito bom, Vladimir! Ler seu texto, me remeteu ao tempo em que orientava os licenciandos da EMUS UFBA, nos estágios, regendo os corais graduados da extensão. Sábiamente, você conseguiu mostrar um panorama de como lidar com o côro,em qualquer idade, focando as necessidades básicas do idoso. Parabéns!

Vladimir Silva disse...

Marineide, que bom saber que você fez esse trabalho na EMUS-UFBA. Certamente, deixou plantada muitas sementes que devem estar frutificando por lá. Abraço.

Postar um comentário